É inegável a
contribuição do genial Jorge Ben (Jor) a MPB. No meu "ranking"
particular, ele facilmente figura no "Top 10". Além disso, ele pode ser considerado
um dos pontos de partida para entendermos a nossa música popular de uns 50 anos
para cá. Eu sou suspeito para falar dele, pois sou um daqueles admiradores que
escuta sua obra sob diversos pontos de vista. E um dos que mais contribuiu para
essa admiração que eu nutro por ele é o ponto de vista que por esses dias apelidei
de "Didática Jorgebenjorniana". Por quê?
"Didática
Jorgebenjorniana" pois algumas letras de músicas dele são, justamente,
didáticas. Claro, Jorge Ben (Jor), se comparado a algumas figuras de sua geração,
como Chico Buarque, Gil, Caetano, está longe de ser considerado um letrista de mão
cheia. E confesso que algumas de suas letras de música confirmam isso (até hoje
me pergunto, por exemplo, o sentido por
trás da letra de "W/Brasil", com os famosos versos "Jacarezinho!
Avião!/Cuidado com o disco voador/Tira essa escada daí/Essa escada é prá ficar
aqui fora/Eu vou chamar o síndico/Tim Maia!"). Porém, algumas outras são verdadeiras
aulas. E vou falar só os exemplos que vieram à minha cabeça, pois provavelmente
tem outras músicas que seguem esse padrão, mas que eu precisaria de um tempo
para lembrar. Vou focar em quatro letras, uma que é uma aula básica de Química,
e três que tem uma incrível relação com minha área de trabalho (a História).
São elas, "Os Alquimistas Estão Chegando" (do álbum "A Tábua da
Esmeralda"), "África Brasil (Zumbi)", "Xica da Silva" e "Taj
Mahal" (do álbum "África Brasil").
"Os
Alquimistas Estão Chegando"
Uma aula
básica de Química, em que Jorge Ben (Jor) descreve um pouco o modo de trabalho
dos alquimistas (que, grosso modo, poderiam ser considerados os "pais" dos
químicos) em busca da Pedra Filosofal. Versos como " Eles são discretos/E
silenciosos/Moram bem longe dos homens" e " Evitam qualquer
relação/Com pessoas/De temperamento sórdido... " nos mostram que os
alquimistas buscavam o isolamento para fazer suas experiências sem serem
incomodados, como um bom estudioso preza. Mas os versos mais reveladores são os
que falam sobre os métodos e os instrumentos que eles utilizavam ("Executam/Segundo
as regras herméticas/Desde a trituração, a fixação/A destilação e a
coagulação... " e " Trazem consigo, cadinhos/Vasos de vidro/Potes de
louça/Todos bem e iluminados ").
"África
Brasil (Zumbi)"
Uma
verdadeira aula sobre Brasil Colonial, em que ele começa a letra enumerando as
diferentes procedências dos negros escravizados ("Angola, Congo, Benguela/Monjolo,
Cabinda, Nina/Quiloa, Rebolo"). Logo depois, descreve magistralmente, o
destino dos negros que chegam aqui no Brasil escravizados ("Aqui onde
estão os homens/Há um grande leilão/Dizem que nele há uma princesa à venda/Que
veio junto com seus súditos/Acorrentados em carros de boi") e também
descreve os lugares em que essa mão-de-obra negra era utilizada ("Pois
aqui onde estão os homens/Dum lado, cana-de-açúcar/Do outro lado, um imenso
cafezal/Ao centro, senhores sentados/Vendo a colheita do algodão branco/Sendo
colhidos por mãos negras ") e por fim a homenagem a uma das figuras negras
mais emblemáticas do período colonial, Zumbi, que ainda surgirá como um herói
para acabar com essa exploração ("Eu quero ver quando Zumbi chegar/Eu
quero ver o que vai acontecer/Zumbi é senhor das guerras").
Particularmente, é uma das minhas músicas prediletas.
"Xica
da Silva"
Música em
homenagem a uma outra figura negra emblemática que viveu durante o período
colonial, Chica da Silva. Agora o pano de fundo é a exploração das minas de
ouro e diamantes da região de Minas Gerais, que teve seu ápice durante o século
XVIII. Jorge Ben (Jor) descreve todo o luxo que cercava Chica da Silva, que manteve
uma relação consensual com o "fidalgo tratador João Fernandes", rico
contratador de diamantes (obrigado Wikipédia! Tem horas que você usa as
melhores palavras). Jorge Ben (Jor) fala brevemente sobre a trajetória da personagem, que
foi de escrava alforriada a amante do fidalgo citado, contudo dá um enfoque maior no luxo (e
ostentação) de Chica da Silva. A letra toda merece destaque, pois é muito
descritiva. Acho até injusto pegar alguns versos. Mas uma mulher que tinha um
castelo, um lago artificial e era obrigada a "A ser recebida/Como uma grande
senhora/Da corte/Do Rei Luís" não merece passar anonimamente pela nossa
história...
"Taj
Mahal"
Com certeza
a mais famosa das músicas aqui descritas, "Taj Mahal" é inspirada na
história da construção do famoso mausoléu indiano, que foi construído pelo imperador
Shan Jahan em homenagem a sua falecida esposa Mumtaz Mahal. É a menos
descritiva (e a mais cheia de "tereteretê") das letras que coloquei
aqui, pois ele explica muito por alto essa história de amor, que, por sinal,
vale a pesquisada, pois é uma senhora história de amor. Apesar de ser uma letra breve, merece o destaque.
Essa é só
uma das facetas do gênio Jorge Ben (Jor). Mais pra frente eu espero trazer pra
vocês outras impressões que tenho quando escuto as músicas dessa grande figura!
Um comentário:
É verdade mesmo Flávio, tem letras do cara que fazem a gente querer pesquisar melhor sobre o assunto. Que bom que você está voltando pro mundo dos blogueiros. Depois da uma sacada lá na minha página! Vlw mlk Abraços
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